Fedro - Platão

segunda-feira, 8 de junho de 2009


Platão começa seu livro com um diálogo entre Fedro e Sócrates referente as principais idéias do discurso de Lísias. O diálogo pode ser dividido em duas partes, a primeira que se preocupa em expor o discurso de Lísias e relata o primeiro discurso de Sócrates, que assume um caráter consensual, norteado a partir de um doxa comum, e a segunda parte que consiste no segundo discurso de Sócrates que, se diferencia do seu primeiro discurso, levando a idéia do Amor para uma esfera filosófica. Portanto o livro ramifica-se em uma dupla direção e se efetua em dois diferentes discursos: um primeiro, onde se explicita e se efetua a ordenação formal do discurso de Lísias; e um segundo, crítico, onde Sócrates contraria a forma e se subverte o conteúdo da defesa de Lísias para introduzir a concepção filosófica do amor. Evidente que entre estes discursos há inferências do leitor do discurso, Fedro.
A primeira parte do livro traz em um primeiro momento, uma critica ao amoroso e também ao amor, dentre os axiomas contidos estão as idéias de que o amoroso é um louco que se deve desconfiar, que o aperfeiçoamento moral do amado é tornado como impossível por aquele que é amoroso, também ressalta que no relacionamento há a inconstância daquele que é amoroso e a constância daquele que não o é, evidenciando um, sendo levado por seus impulsos e o outro preso pelo seu amante, comenta sobre o ciúme do amoroso isolando completamente aquele que o ama tornando o amante desagradável por sua presença cotidiana e pela exigência que faz do amado.
Depois desta critica, há uma distinção entre as tendências ou formas particulares do desejo (inato ou adquirido), bem como o princípio que o determina (instinto ou razão) (237d-238c). O amor é então concebido em função de seu caráter irresistível, de sua força destemperada. Desse modo, há uma crítica ao desejo, tornando a potencia de Eros, por definição, condenável ou censurável, esse fator é utilizado para justificar a paradoxal defesa de Lísias de um Eros sem amor.
A partir desta subestimação do desejo e do amor do amante, inicia-se o Segundo discurso socrático. A refutação socrática do discurso de Lísias que condena o amor-paixão e defende um amor sem amor, se desenvolve no sentido oposto e pretende demonstrar que o delírio e a possessão divina representam antes um benefício ou um dom. Dádiva dos deuses e fonte de sabedoria, a loucura divina se distingue da loucura vulgar, cuja causa é devida às doenças do corpo. É da mania (desejo) divina que provém nossos maiores benefícios: é ela que inspira as profetizas de Delfos e as sacerdotisas de Dódona, concede, pelo elogio dos poetas, a imortalidade dos heróis (244a-245a). Reconhecendo o amor como um delírio procedente de Eros, divina loucura, considera-se nisso signos da graça de um deus e, igualmente, um benefício (245c). Todo o segundo discurso socrático visa, com efeito, relacionar os benefícios e as virtudes que decorrem, naturalmente, da inspiração erótica, com isso não há uma critica ao desejo, mas sim, uma nova concepção do mesmo mostrando que o desejo, que define o amor, pode contrariar voluntária e deliberadamente o apetite. O desejo, que “resiste” ao apetite, já indica a existência no interior da alma de outro princípio de determinação. O próprio discurso de Lísias ao se pretender “resistente” ao apetite já reconhecia implicitamente a possibilidade de outra forma de amor. Sócrates também no seu discurso se preocupa em fazer uma conceituação da Alma ressaltando que é a partir da Imortalidade da Alma onde se extraem os fundamentos para considerar a natureza das ações e afeições. A imortalidade da alma se verifica a partir da noção de movimento (kinesis), Definida como “aquilo que se move a si mesma” (autokineton) (245c), a alma, pode ser concebida como um princípio (arché).
O princípio não corresponde sempre a algo que nunca começa a existir, ao contrário, é algo a partir do qual começa a existir tudo aquilo que existe. A título de princípio da geração (gênesis) e do movimento, a alma é, por conseqüência, incorruptível, ou seja, imortal (athanatos) (245d).
Sócrates defende que a alma é, também, um princípio epistemológico, potência espontânea que faz pensar. O próprio conhecimento é uma função privilegiada da alma na medida em que deriva dessa atividade ou movimento da inteligência (nous) que consiste em retornar (recordar) à natureza constitutiva das coisas.
Pelo seu equivoco, Sócrates sente-se obrigado a realizar uma retratação (palinodia) à profanação realizada em seu primeiro discurso, trazendo desta forma um novo entendimento do amor mítico. Ele defende que Eros age sobre a alma humana impulsionando-a “em direção à busca de uma satisfação que transcende a experiência terrestre”. O discurso filosófico sobre Eros implica considerar a dupla natureza do homem e explicitar a natureza da alma, seus estados e atos, a sua relação com o corpo. Eros portanto, passa a ser tornado como filósofo, como aquele que se endereça a verdade. Também relacionando o amor com a divindade, Sócrates expressa que cada homem escolhe, o amor segundo o seu caráter e em função daquilo que pôde outrora contemplar, do mesmo modo, considera o objeto escolhido a partir da imagem que tem da divindade (252d). É sob o signo e à imagem das diferentes divindades que se apresentam as diferentes formas de amar.
Sócrates conclui o diálogo com a apresentação daquilo que entende como amor ideal, que em seu entendimento é o amor do filósofo, é nele aonde a melhor parte da alma sai vitoriosa, é um modelo de virtude ou de excelência, correspondente ao modelo de vida exemplar. Constitui-se de um convite ao amado para que abandone sua condição de objeto e se torne, ele também um sujeito ativo (amante). A afeição que o amado nutre pelo amante deve, igualmente converter-se nessa “afinidade” (philia) pela sabedoria (sophia) e nesse amor pela verdade, diz-se: philosophia. O amado deve tornar-se, à semelhança do amante, um amigo da sabedoria e um amante da verdade, um filósofo. O Eros filosófico, pela reciprocidade que exige, faz nascer um anteros, um contra-amor que se origina no amante, mas que faz confluir ambos em direção à verdade. O amante-filosófico, aquele a quem se deve ceder, reflete a imagem do amado e este como em um espelho vê-se refletido a si próprio e acaba por ceder a esse amor e a seus fins elevados (245d - 256a). A sabedoria do filósofo consiste, com efeito, em conjugar o intuitivo e o racional e em saber que a verdade não se liga a nenhum conteúdo particular e não se reduz a nenhuma fórmula especial.
Ao lermos o livro, percebemos que Platão, utilizando-se do dialogo entre Fedro e Sócrates consegue trazer um entendimento inovador no que se refere a relação entre; amor, amante e amado, aplicando o método dialético pela contraposição entre um discurso mítico e racional até o momento que chegam ao dialogo tido como filosófico, apesar disso, Platão não deixa de lado o caráter mítico do amor, percebe-se no dialogo que o mito não é só passivo, mas dialoga ativamente com a razão também.
Platão deixa claro que, a verdadeira função da filosofia é educar a alma: A verdadeira retórica, consiste em educar a alma através do viés da verdade, não levando em conta desejos particulares, por isso Platão indicou uma nova pedagogia a filosofia, tendo em vista conduzir a alma e torná-la melhor, ele considera que o fato de educar a alma não pode ser dado mediante a uma analise ou definição, conceitos, apenas através de uma mediação por imagens, há com isso um paradoxo, aparta-se da matéria e ao mesmo dela participa-se com ela.
Observamos também que Platão, com relação ao amor filosófico, define o amado possuindo uma ação ativa na relação indo em direção ao amante, o jogo dos contrários a sedução faz com que os dois mantenham a relação, mas isso não faz com que tenham ausência de seus papeis, ambos se preservam em seus estados mas são misturados em Amor, não se pode pensar em um sem ligação a outro.

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